segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Conversa de Trancoso?





Albertina Xique-chik
Logo cedo se apronta.
Põe a lenha na fornalha
Assim que o galo canta.
Joga mio pras galinha 
No terreiro chei de planta
É fejão, é macachera,
Lá na horta e na cozinha.

De madêra tem pilão 
Pra pilar mio e farinha
Girgilin e café forte
Daqueles de trocê lingua.

Tudo isso,diz Bebé,
É o milhor que há na vida.

Mas Albertina Xique-chik,
Sofre d"um má qui não tem cura.
A danada da veinha é pior do quê cajaca,
Inda alega ser caduca.
Ela ajunta cacareco
No buraco que achar,
É no chão véio vermeio
Da sala de está...

Um dia vou te levar
Lá na casa de Albertina
Pro seus olho ver assombro
Cumeçando da curtina:

Florida de toda estampa 
Com remendo fuxicado
Os cacho de flor de prástico
Pendurado por todo lado.

Os retrato de pulitico
Nas parede desbotado,
E no quarto pra visita
É foto que dói na vista,
Com destaque pros finado!

Lá tem tanta raridade
Que as coisa do museu
A poiqueira é comparada.
Armador de madeira
Gancho pra chapéu de pálha.

Tanta coisa assim de doido,
Tem que ir lá pra acreditar,
A galinha pondo ovo 
No buraco do sofá.

Os arreio dos cavalo,
Pendurado lá nas téia.
Junto cum os inchú de abêlha.
E a jurema do quintal
De roupa sempre enfeitada,
dispensa o antigo varal!

Albertina do jeito que é
Num pudia, era deixar
De interrar uma butija.
O medo é que dento dela
De ouro num tenha nada.

Vai que a véia intarrasse 
tudo qui ela mais gostava?

Por sê igual a burra
De Zé cigano véi
Cuberta de bijú da cabeça até os pés.
Acunhava carmim nos beiço
Que de longe encandiava.

O meu medo é que a butija 
Têja cheia dessas tralha!

Cá pra nós: Se Bebé disconfiar
Desse plano de achá 
A butija escondida
Antes de já tá batida
As bota da cumadre!

O chão não vai ficá duro
Mais amigo eu te juro
Que a Bebé vai se vingar!

Enchendo a butija.
_ De quê?
Vou te contar:

Anágua rasgada o elástico
Vestido de chita amofado.
Volta queimada do forno,
O dente de leite e a chapa dela,

Um pinico de latão,
Caco de pireco de loça,
E de barro uma panela!
E o pior nem é isso 
Do tesouro sem valia
Que a gente anda imaginando.

Mais ruim é a vassôra
que ela bota atrás da porta,
Pra impedir a sua volta 
E a butija protegê.

Assim Só vai crescendo
O piolho de todo mundo.
O jeito é esperar,pra Bebé num viver muito.

E torcer pro baú,num ser igual a casa dela:
Um ninho de cajaca de couro,
E sim pra ser recheado
De prata e moeda de ouro.

Ana Luíza Dantas de Lira



Cajaca,Cajaca de couro ou Casaca de couro: Ave típica da caatinga,que faz um ninho bem curoso com tudo que tem direito.Pente velho,espelho,garranchos,folhas,embalagem de creme dental, etc. Ela é marrom avermelhada, de topete.E possui um canto também bonito.Veja as fotos: http://www.wikiaves.com.br/298939&t=s&s=11113&p=1

Cacareco: Porcaria,coisa sem valia.
 
Jurema:  A Jurema é uma planta da família das leguminosas, comum no Nordeste brasileiro, com propriedades psicoativas.

Butija: Tesouro enterrado:  No sertão a lenda da botija ou  butija,dizia que antes de morrer,a pessoa deixava uma botija enterrada, depois de morta a pessoa viria em sonho, avisar a alguém o local da botija.E esse alguém teria de guardar segredo e ir sozinho a grande caçada,exceto se no sonho houvesse mais alguém.Nesse caso as duas pessoas iriam procurá-la e ao desenterrar deveriam utilizar objetos de madeira, ou só as mãos.Caso contrário o chão endureceria,a butija não seria encontrada e os sortudos morreriam.
Uma vez seguida todas as etapas e com a butija em mãos, no espaço de uma semana deveriam mudar de casa,ou trocar as portas, caso não ocorresse assim o morto tomaria a dinherama e os sortudos morreriam misteriosamente.Trágico!

Volta: Pano de enchugar loças.

Pireco: Pires.





* Foto retirada do blog:  O Typhis Pernambucano.


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